Experimento mental junta teoria científica e questões mais amplas sobre como a vida altera um planeta, para postular quatro estágios para descrever o passado e possível futuro da Terra. [Imagem: Michael Osadciw/Universidade de Rochester]
Gaia consciente
Está na hora de dar um upgrade na hipótese Gaia, indo um passo além e arguindo consciência para um planeta repleto de vida.
Esta é a ideia apresentada agora por Adam Frank (Universidade de Rochester), David Grinspoon e Sara Walker (Universidade do Estado do Arizona).
A hipótese Gaia, de autoria do professor James Lovelock, vem sendo a referência fundamental para explicar como a vida persistiu na Terra apesar do dinamismo do planeta. Ela propõe que a biosfera interage fortemente com os sistemas geológicos não-vivos de ar, água e terra para manter o estado habitável da Terra.
Considere, por exemplo, as plantas: As plantas "inventaram" uma maneira de fazer fotossíntese para aumentar sua própria sobrevivência, mas, ao fazê-lo, elas liberaram oxigênio, que mudou tudo no nosso planeta. Este é apenas um exemplo de formas de vida individuais realizando suas próprias tarefas, mas tendo coletivamente um impacto em escala planetária.
Mas o que o trio está propondo agora vai além: Se a atividade coletiva da vida - conhecida como biosfera - pode mudar o mundo, será que a atividade coletiva da cognição e a ação baseada nessa cognição também podem mudar um planeta? Uma vez que a biosfera evoluiu, a Terra ganhou vida própria; se um planeta com vida tem vida própria, ele também pode ter mente própria?
E não é apenas especulação: Naquilo que eles chamam "experimento de pensamento", os pesquisadores combinam a compreensão científica atual sobre a Terra com questões mais amplas sobre como a vida altera um planeta.
Eles usam o que chamam de "inteligência planetária" - a ideia de uma atividade cognitiva operando em escala planetária - para levantar novas ideias sobre as maneiras pelas quais os humanos podem lidar com questões globais, como as mudanças climáticas.
Cada camada dos sistemas planetários acoplados constitui sua própria rede de interações químicas e físicas. [Imagem: Adam Frank et al. - 10.1017/S147355042100029X]
Homem a serviço do planeta
O trio começa fundamentando seu experimento mental citando os estudos recentes de biologia que demonstraram como as raízes das árvores em uma floresta se conectam através de redes subterrâneas de fungos, conhecidas como redes micorrízicas.
Se uma parte da floresta precisa de nutrientes, as outras partes enviam às porções estressadas os nutrientes de que precisam para sobreviver, através da rede micorrízica. Dessa forma, a floresta mantém sua própria viabilidade.
Mas tem também o homem.
No momento, nossa civilização é o que os pesquisadores chamam de "tecnosfera imatura", um conglomerado de sistemas e tecnologias produzidas por humanos que afeta diretamente o planeta, mas não é autossustentável.
Por exemplo, a maior parte do nosso uso de energia envolve o consumo de combustíveis fósseis, que degradam os oceanos e a atmosfera da Terra. A tecnologia e a energia que consumimos para sobreviver estão afetando o planeta, o que, por sua vez, pode ameaçar nossa espécie.
Seria razoável então que, para sobreviver como espécie, precisamos trabalhar coletivamente no melhor interesse do planeta. "Mas ainda não temos a capacidade de responder comunitariamente pelos melhores interesses do planeta. Há inteligência na Terra, mas não há inteligência planetária," disse Frank.
A esperança está no "ainda" expresso por Frank: Pode ser que estejamos em um processo evolutivo, e apenas "ainda" não tenhamos chegado lá. E, agora que sabemos que a evolução biológica não é aleatória como os cientistas pensavam, e dada a capacidade do homem de tomar ações pensadas, talvez possamos acelerar isto.
Quatro domínios possíveis da inteligência planetária. [Imagem: Adam Frank et al. - 10.1017/S147355042100029X]
Rumo à inteligência planetária
Os pesquisadores postulam quatro estágios do passado e possível futuro da Terra para ilustrar como a inteligência planetária pode desempenhar um papel no futuro de longo prazo da humanidade. Eles também mostram como esses estágios de evolução impulsionados pela inteligência planetária podem ser uma característica de qualquer planeta da galáxia que evolua a vida e uma civilização tecnológica sustentável.
Estágio 1 - Biosfera imatura: Característica da Terra muito primitiva, bilhões de anos atrás e antes de uma espécie tecnológica, quando os micróbios estavam presentes, mas a vegetação ainda não havia surgido. Havia poucas realimentações globais porque a vida não podia exercer forças sobre a atmosfera, hidrosfera e outros sistemas planetários.
Estágio 2 - Biosfera madura: Característica da Terra também antes de uma espécie tecnológica, de cerca de 2,5 bilhões a 540 milhões de anos atrás. Continentes estáveis se formaram, a vegetação e a fotossíntese se desenvolveram, o oxigênio se acumulou na atmosfera e a camada de ozônio emergiu. A biosfera exerceu uma forte influência sobre a Terra, talvez ajudando a manter a habitabilidade da Terra.
Estágio 3 - Tecnosfera imatura: Característica da Terra atual, com sistemas interligados de comunicação, transporte, tecnologia, eletricidade e computadores. Contudo, a tecnosfera ainda é imatura, porque não está integrada a outros sistemas da Terra, como a atmosfera. Em vez disso, ele extrai matéria e energia dos sistemas da Terra de maneiras que levarão o todo a um novo estado que provavelmente não inclui a própria tecnosfera. Nossa tecnosfera atual está, a longo prazo, trabalhando contra si mesma.
Estágio 4 - Tecnosfera madura: Onde a Terra deve almejar estar no futuro, com sistemas tecnológicos implementados que beneficiam todo o planeta, incluindo a coleta global de energia em formas como a solar, que não prejudicam a biosfera. A tecnosfera madura é aquela que co-evoluiu com a biosfera para uma forma que permite que a tecnosfera e a biosfera prosperem.
"Os planetas evoluem através de estágios imaturos e maduros, e a inteligência planetária é indicativa de quando você chega a um planeta maduro," disse Frank. "A questão de um milhão de dólares é descobrir como é a inteligência planetária e o que ela significa para nós na prática, porque ainda não sabemos como avançar para uma tecnosfera madura."
Representação esquemática da evolução de sistemas planetários acoplados em termos de graus de inteligência planetária. [Imagem: Adam Frank et al. - 10.1017/S147355042100029X]
Complexidade da inteligência planetária
Embora ainda não saibamos especificamente como a inteligência planetária pode se manifestar, os pesquisadores observam que uma tecnosfera madura envolve a integração de sistemas tecnológicos com a Terra por meio de uma rede de ciclos de realimentação que compõem um sistema complexo.
Um sistema complexo é qualquer coisa construída a partir de partes menores que interagem entre si de tal forma que o comportamento geral do sistema é inteiramente dependente da interação. Ou seja, o todo é mais do que a soma de suas partes. Exemplos de sistemas complexos incluem florestas, a internet, os mercados financeiros e o cérebro humano.
Por sua própria natureza, um sistema complexo tem propriedades inteiramente novas, que emergem quando peças individuais estão interagindo. É difícil discernir a personalidade de um ser humano, por exemplo, examinando apenas os neurônios em seu cérebro.
Isso significa que é difícil prever exatamente quais propriedades podem emergir quando indivíduos formam uma inteligência planetária. No entanto, um sistema complexo, como uma inteligência planetária, terá, segundo os pesquisadores, duas características definidoras: Ela terá um comportamento emergente e precisará ser autossustentável.
"A biosfera descobriu como hospedar a vida por si mesma bilhões de anos atrás criando sistemas para movimentar nitrogênio e transportar carbono," disse Frank. "Agora temos que descobrir como ter o mesmo tipo de características de automanutenção com a tecnosfera."
Há vários esforços também para ações ativas, como a conversão do CO2 em combustíveis limpos, como o hidrogênio. [Imagem: UNIST]
Mercado de sequestro de carbono
O Brasil tem potencial para liderar o mercado emergente de sequestro de carbono atmosférico - fundamental para que seja atingida a meta de empurrar o aquecimento global para um patamar abaixo de 1,5 a 2,0 graus Celsius em comparação com o período pré-industrial.
Para isso, o país dispõe de uma formidável reserva de 50 milhões de hectares de terras reflorestáveis, com potencial de regeneração natural espontânea ou de regeneração natural assistida. E o reflorestamento é, de longe, a forma mais efetiva de sequestrar carbono da atmosfera.
Esta é a conclusão do professor Renato Crouzeilles, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que também é pesquisador afiliado ao Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS).
"O mercado voluntário de sequestro de carbono deve crescer até 15 vezes de 2020 a 2030. E, até 2050, entre 7 e 13 gigatoneladas do carbono deverão ser sequestradas anualmente, para compensar as emissões, e atingir a meta de Net Zero," disse Crouzeilles - a expressão "Net Zero" designa a neutralidade de carbono, condição em que todas as emissões remanescentes são compensadas por sequestros.
Preço do carbono
Segundo o pesquisador, o preço do carbono sequestrado ainda é muito baixo, mas em mercados regulados como o europeu a tonelada de carbono sequestrado já alcança o valor de €69,00. "A demanda já é grande e tende a aumentar, o preço também, e a oferta ainda é baixa e de baixa qualidade," afirmou.
A qualidade da oferta de sequestro de carbono é aferida a partir de três critérios. O primeiro é o da "durabilidade", isto é, por quanto tempo o sequestro poderá ser mantido. O segundo critério é o da "adicionalidade", que só se aplica quando o reflorestamento atende estritamente ao objetivo do sequestro de carbono. Uma floresta reconstruída para extração de madeira não pode ser apresentada como uma adição que só se tornou possível devido ao financiamento obtido no mercado de carbono. O terceiro critério, finalmente, é que não haja "vazamento", isto é, que o reflorestamento em determinada área não implique desmatamento em outra.
"O Brasil apresenta uma das maiores oportunidades para reflorestamento em larga escala e a baixo custo visando remover CO2 da atmosfera," enfatizou o pesquisador, listando quatro vantagens do país: Alto potencial de sequestro de carbono; baixo custo para o reflorestamento; grande quantidade de área disponível; e alto potencial para regeneração natural assistida.
Custo de oportunidade
Em vez de fechar os olhos diante de uma política obtusa de desmatamento e predação dos recursos naturais, os agentes econômicos brasileiros deveriam enxergar a preservação e a reconstrução das florestas como um dos maiores e potencialmente mais lucrativos patrimônios do país.
"Devido às condições climáticas, a Amazônia e a Mata Atlântica estão entre os melhores locais do mundo para o sequestro de carbono. E, principalmente na Amazônia, o custo de oportunidade para isso é baixo," comentou Crouzeilles.
O "custo de oportunidade", ele explicou, é o montante de dinheiro que o proprietário rural deixa de ganhar ao redirecionar parte de sua área da atividade agropecuária para o reflorestamento. Em lugares distantes da fronteira de expansão do agronegócio, esse redirecionamento pode ser uma opção bastante vantajosa do ponto de vista econômico, para não falar de suas virtudes ambientais.
Crouzeilles disse que grandes corporações, como a Microsoft, a Apple, a Amazon e outras, estão bastante engajadas na política de carbono neutro até 2050. E que a Microsoft, em especial, não apenas quer zerar seu balanço de emissões, como também apagar toda a "pegada de carbono" deixada ao longo de sua história.
De acordo com o pesquisador, o mercado de sequestro de carbono é altamente promissor para o Brasil. Mas é preciso agir logo, e com alta velocidade, porque a meta de reduzir o aquecimento global abaixo de 1,5 a 2,0 graus Celsius até 2030 continua longe de ser alcançada.
A cobertura refrescante foi projetada para uma instituição de ensino na Índia.
o Uma cobertura escalonada que forma uma série de jardins acessíveis. Assim foi projetada a Prestige University, que será erguida em Indore, na Índia. A instituição de ensino criará uma área verde de lazer que integra-se ao ambiente ao redor.
O projeto do estúdio Sanjay Puri Architects, sediado em Mumbai, é um edifício de tijolos vermelhos de cinco andares com degraus que se elevam do solo ao telhado, formando pequenos pátios ajardinados conectados por pequenas escadas. Este terraço ficará acessível para alunos e funcionários.
Alguns dos pátios ajardinados começam no interior do edifício, criando a conexão com o ar livre enquanto possibilita a iluminação e ventilação natural. Outras técnicas para levar refrescar a universidade serão aplicadas. “Esses elementos de design são planejados em resposta ao clima da cidade, que varia de 30º a 40º Celsius durante oito meses do ano”, afirmou o escritório de arquitetura ao site Dezeen.
O foco foi pensar em como criar um edifício sustentável com eficiência energética e dependência mínima de iluminação artificial e ar condicionado. Ainda segundo a Sanjay Puri Architects, o projeto leva em consideração a arquitetura tradicional indiana na escolha de materiais e em sua capacidade de se adaptar ao clima local.
Os espaços internos e externos ainda promovem o envolvimento e a interação social.
“ALÉM DE ABRIGAR INÚMERAS ATIVIDADES, O PRÉDIO SE TORNARÁ UM GRANDE ESPAÇO PÚBLICO ABERTO COM UM ANDAR TÉRREO ACESSÍVEL E UM TELHADO PAISAGÍSTICO”
Sanjay Puri Architects
A conclusão do projeto da Prestige University está prevista para junho de 2022.
O Big Bang é a nossa visão tradicional da origem do universo
"A última estrela irá esfriar lentamente e desaparecer. Com isso, o universo se tornará mais uma vez um vazio, sem luz, vida ou significado." Assim alertou o físico Brian Cox na recente série Universe, da BBC.
O desaparecimento da última estrela será apenas o início de uma época infinitamente longa e escura. Toda a matéria será eventualmente consumida por buracos negros monstruosos, que por sua vez irão evaporar nos mais tênues lampejos de luz.
O espaço se expandirá cada vez mais para fora até que mesmo aquela luz fraca se torne muito espalhada para interagir. A atividade cessará.
Ou não? Estranhamente, alguns cosmólogos acreditam que um universo anterior, frio, escuro e vazio, como aquele que está em nosso futuro distante, poderia ter sido a fonte de nosso próprio Big Bang.
A primeira matéria
Mas antes de chegarmos a isso, vamos dar uma olhada em como "material" - matéria física - surgiu pela primeira vez.
Se pretendemos explicar as origens da matéria estável feita de átomos ou moléculas, certamente não havia nada disso por volta do Big Bang - nem por centenas de milhares de anos depois. Na verdade, temos uma compreensão bastante detalhada de como os primeiros átomos se formaram a partir de partículas mais simples, uma vez que as condições esfriaram o suficiente para que a matéria complexa se tornasse estável, e como esses átomos foram posteriormente fundidos em elementos mais pesados dentro das estrelas. Mas esse entendimento não aborda a questão de saber se algo veio do nada.
Então, vamos pensar um pouco mais para trás. As primeiras partículas de matéria de vida longa de qualquer tipo foram prótons e nêutrons, que juntos formam o núcleo atômico. Eles surgiram por volta de um décimo de milésimo de segundo após o Big Bang.
Antes desse ponto, não havia realmente nenhum material em qualquer sentido familiar da palavra. Mas a física nos permite seguir rastreando a linha do tempo para trás - para processos físicos que antecedem qualquer matéria estável.
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As primeiras partículas de matéria de vida longa de qualquer tipo foram prótons e nêutrons, que juntos formam o núcleo atômico
Isso nos leva à chamada "era da grande unificação". Agora, estamos bem no reino da física especulativa, pois não podemos produzir energia suficiente em nossos experimentos para sondar o tipo de processo que estava acontecendo na época.
Mas uma hipótese plausível é que o mundo físico era feito de uma sopa de partículas elementares de vida curta - incluindo quarks, os blocos de construção de prótons e nêutrons.
Havia matéria e "antimatéria" em quantidades aproximadamente iguais: cada tipo de partícula de matéria, como o quark, tem um companheiro "imagem espelhada" de antimatéria, que é quase idêntico a si mesmo, diferindo apenas em um aspecto.
No entanto, matéria e antimatéria se aniquilam em um lampejo de energia quando se encontram, o que significa que essas partículas foram constantemente criadas e destruídas.
Mas como essas partículas passaram a existir em primeiro lugar? A teoria quântica de campos nos diz que mesmo um vácuo, supostamente correspondendo ao espaço-tempo vazio, está cheio de atividade física na forma de flutuações de energia.
Essas flutuações podem dar origem ao surgimento de partículas, que desaparecem logo em seguida. Isso pode soar mais como uma peculiaridade matemática do que como física real, mas tais partículas foram detectadas em incontáveis experimentos.
O estado de vácuo do espaço-tempo está fervilhando com partículas sendo constantemente criadas e destruídas, aparentemente "do nada". Mas talvez tudo isso realmente nos diga que o vácuo quântico é (apesar do nome) alguma coisa em vez de nada.
O filósofo David Albert criticou de forma memorável os relatos do Big Bang que prometem obter algo do nada dessa forma.
Suponha que perguntemos: de onde surgiu o próprio espaço-tempo? Então, podemos continuar girando o relógio ainda mais para trás, na verdadeiramente antiga "Era de Planck" - um período tão antigo na história do universo que nossas melhores teorias da física entram em colapso.
Essa era ocorreu apenas um décimo milionésimo de um trilionésimo de um trilionésimo de um trilionésimo de segundo após o Big Bang. Nesse ponto, o próprio espaço e o tempo ficaram sujeitos às flutuações quânticas.
Os físicos normalmente trabalham separadamente com a mecânica quântica, que rege o micromundo das partículas, e com a relatividade geral, que se aplica a grandes escalas cósmicas. Mas para compreender verdadeiramente a Era de Planck, precisamos de uma teoria completa da gravidade quântica, fundindo as duas.
Ainda não temos uma teoria perfeita da gravidade quântica, mas existem tentativas - como a teoria das cordas e a gravidade quântica em loop. Nessas tentativas, o espaço e o tempo comuns são tipicamente vistos como emergentes, como as ondas na superfície de um oceano profundo.
O que experimentamos como espaço e tempo é o produto de processos quânticos operando em um nível microscópico mais profundo - processos que não fazem muito sentido para nós como criaturas enraizadas no mundo macroscópico.
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De onde surgiu o próprio espaço-tempo?
Na Era de Planck, nosso entendimento comum de espaço e tempo se desintegra, então não podemos mais confiar em nosso entendimento comum de causa e efeito também. Apesar disso, todas as candidatas a teoria da gravidade quântica descrevem algo físico que estava acontecendo na Era de Planck - algum precursor quântico do espaço e tempo. Mas de onde veio isso?
Mesmo que a causalidade não se aplique mais de forma comum, ainda pode ser possível explicar um componente do universo da Era de Planck em termos de outro. Infelizmente, até agora mesmo nossa melhor física falha completamente em fornecer respostas.
Enquanto não progredirmos em direção a uma "teoria de tudo", não seremos capazes de dar uma resposta definitiva. O máximo que podemos dizer com segurança neste estágio é que a física até agora não encontrou exemplos confirmados de algo surgindo do nada.
Ciclos de quase nada
Para responder verdadeiramente à questão de como algo pode surgir do nada, precisaríamos explicar o estado quântico de todo o universo no início da Era de Planck. Todas as tentativas de fazer isso permanecem altamente especulativas.
Alguns deles apelam a forças sobrenaturais como um designer. Mas outras explicações candidatas permanecem dentro do reino da física - como um multiverso, que contém um número infinito de universos paralelos, ou modelos cíclicos do universo, nascendo e renascendo novamente.
O físico Roger Penrose, ganhador do Prêmio Nobel de 2020, propôs um modelo intrigante, mas controverso, para um universo cíclico denominado "cosmologia cíclica conformada".
Penrose foi inspirado por uma conexão matemática interessante entre um estado muito quente, denso e pequeno do universo - como era no Big Bang - e um estado extremamente frio, vazio e expandido do universo - como será em um futuro distante.
Sua teoria radical para explicar essa correspondência é que esses estados se tornam matematicamente idênticos quando levados aos seus limites. Por mais paradoxal que pareça, uma ausência total de matéria pode ter conseguido dar origem a toda a matéria que vemos ao nosso redor em nosso universo.
Nessa visão, o Big Bang surge de um quase nada. É o que sobrou quando toda a matéria em um universo foi consumida em buracos negros, que por sua vez se transformaram em fótons - perdidos em um vazio.
Todo o universo, portanto, surge de algo que - visto de outra perspectiva física - é o mais próximo que se pode chegar de nada. Mas esse nada ainda é um tipo de coisa. Ainda é um universo físico, embora vazio.
Como pode o mesmo estado ser um universo frio e vazio de uma perspectiva e um universo quente e denso de outra? A resposta está em um procedimento matemático complexo denominado "reescalonamento conformado", uma transformação geométrica que na verdade altera o tamanho de um objeto, mas deixa sua forma inalterada.
Penrose mostrou como o estado denso frio e o estado denso quente podem ser relacionados por tal reescalonamento, de modo que eles correspondam com respeito às formas de seus espaços-tempos - embora não com seus tamanhos.
É, reconhecidamente, difícil entender como dois objetos podem ser idênticos desta forma quando têm tamanhos diferentes - mas Penrose argumenta que o tamanho é um conceito que deixa de fazer sentido em tais ambientes físicos extremos.
Na cosmologia cíclica conformada, a direção da explicação vai do velho e frio para o jovem e quente: o estado quente denso existe por causa do estado frio e vazio. Mas esse "por causa" não é o familiar - de uma causa seguida no tempo por seu efeito. Não é apenas o tamanho que deixa de ser relevante nesses estados extremos: o tempo também.
O estado denso frio e o estado denso quente estão, na verdade, localizados em linhas do tempo diferentes. O estado frio e vazio continuaria para sempre da perspectiva de um observador em sua própria geometria temporal, mas o estado quente denso que dá origem efetivamente habita uma nova linha do tempo própria.
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Nos limites do nosso conhecimento, a física e a filosofia tornam-se difíceis de separar
Pode ajudar a entender o estado quente denso como produzido a partir do estado frio e vazio de alguma forma não causal. Talvez devêssemos dizer que o estado quente denso emerge do estado frio, ou está alicerçado nele, ou é realizado pelo estado vazio e frio.
Essas são ideias distintamente metafísicas que foram exploradas extensivamente pelos filósofos da ciência, especialmente no contexto da gravidade quântica, onde a causa e o efeito comuns parecem se desfazer. Nos limites do nosso conhecimento, a física e a filosofia tornam-se difíceis de separar.
Evidência experimental?
A cosmologia cíclica conformada oferece algumas respostas detalhadas, embora especulativas, à questão de onde veio nosso Big Bang. Mas mesmo que a visão de Penrose seja justificada pelo futuro progresso da cosmologia, podemos pensar que ainda não teríamos respondido a uma questão filosófica mais profunda - uma questão sobre de onde veio a própria realidade física.
Como surgiu todo o sistema de ciclos? Então, finalmente terminamos com a pura questão de por que existe algo em vez de nada - uma das maiores questões da metafísica.
Mas nosso foco aqui está nas explicações que permanecem dentro do reino da física. Existem três opções amplas para a questão mais profunda de como os ciclos começaram. Poderia não ter explicação física alguma.
Ou pode haver ciclos que se repetem infinitamente, cada um sendo um universo por si só, com o estado quântico inicial de cada universo explicado por alguma característica do universo anterior. Ou pode haver um único ciclo e um único universo repetido, com o início desse ciclo explicado por alguma característica de seu próprio fim.
As duas últimas abordagens evitam a necessidade de quaisquer eventos não causados - e isso lhes dá um apelo distinto. Nada seria deixado sem explicação pela física.
Para Penrose, cada ciclo envolve eventos quânticos aleatórios que ocorrem de uma maneira diferente - o que significa que cada ciclo será diferente dos anteriores e posteriores. Na verdade, essa é uma boa notícia para os físicos experimentais, porque pode nos permitir vislumbrar o antigo universo que deu origem ao nosso através de traços tênues, ou anomalias, na radiação residual do Big Bang vista pelo satélite Planck.
Penrose e seus colaboradores acreditam que já podem ter detectado esses traços, atribuindo padrões nos dados do Planck à radiação de buracos negros supermassivos no universo anterior. No entanto, suas alegadas observações foram contestadas por outros físicos e o júri permanece fora.
Novos ciclos infinitos são a chave para a própria visão de Penrose. Mas existe uma maneira natural de converter a cosmologia cíclica conformada de um ciclo múltiplo para um ciclo único. Então a realidade física consiste em um único ciclo a partir do Big Bang até um estado máximo de vazio no futuro distante - e então retorna novamente até o mesmo Big Bang, dando origem ao mesmo universo novamente.
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Roger Penrose recebeu o Prêmio Nobel de Física por seu trabalho sobre singularidades
Esta última possibilidade é consistente com outra interpretação da mecânica quântica, apelidada de interpretação de muitos mundos.
A interpretação de muitos mundos nos diz que cada vez que medimos um sistema que está em superposição, essa medição não seleciona um estado aleatoriamente. Em vez disso, o resultado da medição que vemos é apenas uma possibilidade - aquela que ocorre em nosso próprio universo.
Todos os outros resultados de medição atuam em outros universos em um multiverso, efetivamente separados do nosso. Portanto, não importa quão pequena seja a chance de algo ocorrer, se tiver uma chance diferente de zero, então ocorre em algum mundo quântico paralelo.
Existem pessoas como você em outros mundos que ganharam na loteria, ou foram arrastadas para as nuvens por um tufão anormal, ou se incendiaram espontaneamente, ou fizeram as três coisas ao mesmo tempo.
Algumas pessoas acreditam que esses universos paralelos também podem ser observáveis em dados cosmológicos, como impressões causadas por outro universo colidindo com o nosso.
A teoria quântica de muitos mundos oferece uma nova reviravolta na cosmologia cíclica conformada, embora Penrose não concorde com ela. Nosso Big Bang pode ser o renascimento de um único multiverso quântico, contendo infinitos universos diferentes, todos ocorrendo juntos. Tudo o que é possível acontece - então, acontece de novo, de novo e de novo.
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Para Penrose, cada ciclo envolve eventos quânticos aleatórios que ocorrem de uma maneira diferente
Um mito antigo
Para um filósofo da ciência, a visão de Penrose é fascinante. Ele abre novas possibilidades para explicar o Big Bang, levando nossas explicações além de causa e efeito comuns. É, portanto, um grande caso de teste para explorar as diferentes maneiras pelas quais a física pode explicar nosso mundo. Ele merece mais atenção dos filósofos.
Para um amante de mitos, a visão de Penrose é bela. Na forma multi-ciclo preferida de Penrose, ele promete novos mundos infinitos nascidos das cinzas de seus ancestrais. Em sua forma de um ciclo, é uma notável re-invocação moderna da antiga ideia do ouroboros, ou serpente-do-mundo.
Na mitologia nórdica, a serpente Jörmungandr é filha de Loki, um malandro astuto, e do gigante Angrboda. Jörmungandr consome sua própria cauda, e o círculo criado sustenta o equilíbrio do mundo. Mas o mito do ouroboros foi documentado em todo o mundo - inclusive desde o antigo Egito.
O ouroboros de um universo cíclico é realmente majestoso. Ele contém dentro de sua barriga nosso próprio universo, bem como cada um dos estranhos e maravilhosos universos alternativos possíveis permitidos pela física quântica - e no ponto onde sua cabeça encontra sua cauda, está completamente vazio, mas também fluindo com energia em temperaturas de cem mil milhões de bilhões de trilhões de graus Celsius. Até Loki, o metamorfo, ficaria impressionado.
*Alastair Wilson é professor de Filosofia na Universidade de Birmingham (Reino Unido)