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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Quão visionário foi Isaac Asimov

Extraído do site Obvious
por Luciano Leonel Mendes


Isaac Asimov foi um gênio da ficção científica que, com uma espantosa criatividade e habilidade literária, ajudou a plantar robôs, alienígenas e impérios galácticos em nosso imaginário coletivo. Mas além de ser um exímio escritor, Asimov também foi um visionário capaz de prever diversos avanços tecnológicos, décadas antes de suas respectivas concepções. Hoje, suas previsões ainda nos surpreendem. Até onde foi a imaginação deste notável escritor?

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Isaac Asimov é considerado um dos grandes mestres da ficção científica e suas obras tiveram um enorme impacto neste gênero literário, principalmente no que tange robôs. Sua influência é tamanha que o termo “Robotics” (Robótica) foi introduzido na língua inglesa por ele. Não é todo dia que podemos creditar um termo destes a uma única pessoa.

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Alguns dos livros de Asimov que causaram grande impacto no gênero de ficção científica.
Mas antes de tentar entender as previsões de Asimov é interessante saber um pouquinho sobre a sua história e sobre quem ele foi. Asimov nasceu na antiga URSS, descendente de judeus russos, mas seus pais mudaram para Nova Iorque em torno de 1923 quando ele tinha 3 anos de idade, provavelmente para viverem em um lugar livre dos “pogroms”. Vale lembrar que aproximadamente 2 milhões de judeus deixaram a Rússia entre as décadas de 1880 e 1920. Quando criança, Asimov lia histórias de ficção científica em revistas baratas e seus primeiros contos foram escritos quando ele tinha apenas 11 anos de idade. Apesar dele ter cursado química na universidade e de ter desenvolvido sua carreira acadêmica ao ponto de obter o título de Doutor em Bioquímica, sua paixão sempre esteve na ficção científica. Durante toda a sua vida ele escreveu, promoveu, incentivou e divulgou obras de ficção científica, se tornando memorável por isso. Ele faleceu em 1992 devido a complicações causadas pela AIDS, contraída em uma transfusão de sangue realizada em 1983 durante uma operação cardíaca.
A contribuição literária de Asimov é espantosa. São mais de 500 obras, entre livros, contos e romances. Diversas de suas obras foram adaptadas para as telas do cinema ou influenciaram filmes de ficção científica. O Homem Bicentenário (com Robin Williams) e Eu, Robô (com Will Smith) são dois exemplos de contos escritos por Asimov que foram adaptados para o cinema. As três leis da robótica abriram espaço para um sem número de histórias onde robôs sofrem com seus conflitos psicológicos. Todos os amantes de ficção científica conhecem as Três Leis que formavam a base intelectual dos cérebros positrônicos:
Primeira Lei da Robótica: Um robô não pode causar mal, ou por negligência, permitir que o mal aconteça a um ser humano.
Segunda Lei da Robótica: Um robô deve obedecer a um ser humano, a não ser que a ordem dada contrarie a Primeira Lei.
Terceira Lei da Robótica: Um robô deve preservar a sua existência, a menos que isso contrarie a Primeira e a Segunda Leis.
As Três Leis da Robótica são essenciais em um mundo onde robôs inteligentes, capazes de tomar suas próprias decisões e até mesmo de evoluir, convivam harmoniosamente com seres humanos. Posteriormente, uma nova lei da robótica, de maior prioridade que as três leis originais, foi criada em um livro onde os robôs assumem a responsabilidade de governar os seres humanos:
Lei Zero: Um robô não pode causar mal, ou por negligência, permitir que o mal aconteça à humanidade.
Asimov foi um visionário. Em muitos dos seus contos ele previu inovações que se tornaram realidade décadas depois. Em 1964, durante a feira mundial de Nova Iorque, Asimov fez uma série de previsões de como seria o mundo em 2014. Diversas delas se confirmaram e hoje fazem parte do nosso cotidiano. Fibras ópticas de fato conectam o mundo. Telas são usadas para videoconferências, ver fotos, ler documentos e livros. Televisores de paredes e dispositivos de imagem em 3 dimensões também estão por aí.

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Asimov fez algumas previsões incríveis em 1964 sobre o que teríamos em 2014: (a) "Enormes estações de energia solar estarão em atividades nas regiões desérticas e semi-desérticas". (b) Cozinhas irão preparar comidas pré-processadas, aquecendo água e convertendo-a em café...". (c) "Em 2014, apenas naves não tripuladas terão pousado em Marte e expedições humanas estarão em estudo".
E ele foi além disso. Em 1988, quando as conexões de computadores em redes ainda eram experimentos de laboratório, ele previu o impacto da Internet na educação. Basta vermos a popularidade da Khan Academy para entendemos como Asimov estava correto, vários anos antes do fenômeno da Internet.


Ainda é difícil afirmar o quão visionário foi Asimov, pois suas previsões ainda estão acontecendo. Um dos mais recentes exemplos está ligado com um dos seus maiores sucessos: a Trilogia Fundação. Nesta série, Asimov descreve a queda do Império Galático e como uma ciência, denominada por ele de psico-história, poderia ajudar a humanidade a percorrer o caos resultante e a estabelecer o Segundo Império em um intervalo de apenas 1000 anos. A psico-história de Asimov consiste em uma ciência que mistura história, sociologia, processos estocásticos e estatísticas para prever o comportamento de grandes grupos, no caso, a população de uma galáxia. No romance, a psico-história é criada por um brilhante matemático chamado de Hari Seldon. Seldon só foi capaz de aperfeiçoar a psico-história e coletar dados suficientes para sua análise do futuro do império galáctico quando já era muito tarde, e nada poderia ser feito para mudar sua queda. Assim, Seldon estabelece um plano onde duas fundações são criadas “nos opostos” da galáxia e que devem seguir os passos previstos pela psico-história. O grande objetivo era restabelecer a ordem e a estrutura do império no menor tempo possível. A psico-história se baseia em dois princípios para funcionar de forma adequada. O primeiro princípio é que a população em estudo, ou as fontes de informação, devem ser suficientemente grande. O segundo princípio estabelece que a população não pode ter conhecimento da análise resultante da psico-história. Por definição, a psico-história não é capaz de avaliar o comportamento de indivíduos e também não pode tratar de observações fora de seu espaço amostral. Por isso, Seldon não poderia fazer nada, caso a galáxia fosse invadida por seres de outras galáxias e também não poderia antecipar as ações de um indivíduo incomum. Esse segundo caso é tratado na série, quando o Mula, um mutante com poderes psíquicos, invalida as previsões de Seldon, e requer a intervenção da segunda fundação para colocar o plano novamente no eixo.

Mas o que isso tem a ver com a sagacidade de Asimov em prever os avanços da tecnologia? O fato é que hoje estamos vivenciado os primeiros avanços na “psico-história” de Asimov, embora um outro nome seja usado e os objetivos sejam diferentes de prever a queda e renascimento de impérios. Hoje, o nome dado para a análise contextual e estatística de grande volumes de informação, cunhado por Haseeb Budhani em 2008, é “Big Data”. Tal como na psico-história de Seldon, o Big Data não visa prever o comportamento de indivíduos, mas sim de conjuntos, que não precisam ser necessariamente de pessoas. Big Data é empregado hoje para estudos nos campos de economia, física, biologia, sociologia e diversos outros.
Com o Big Data, o interesse não está na mecânica precisa da relação de causa e efeito de um fenômeno complexo, mas sim nas correlações de comportamentos que podem ser usadas para estimar um determinado resultado com certa probabilidade. Complicado? É sim, e muito! Mas o conceito é bem semelhante àquele apresentado por Asimov na sua famosa trilogia. A psico-história de Seldon é muito mais poderosa do que nosso Big Data de hoje, mas estamos somente engatinhando no processo de coleta de dados. As empresas de telecomunicações já vislumbram um futuro muito próximo onde cada pessoa terá dezenas de dispositivos conectados à Internet, fazendo diversas medições, gerando conteúdos e alimentando banco de dados, cujo processamento poderá revelar tendências e indicar a oferta de produtos e serviços praticamente irresistíveis para os respectivos grupos-alvo.
O projeto Web Bot também pode ser visto como uma primeira tentativa de análise de grandes volumes de informações para tentar fazer previsões sobre o futuro, bem na linha da psico-história. Nesta iniciativa, robôs (“bots”) buscam palavras chaves geradas diariamente na Internet e, através de algoritmos mantidos em segredo absoluto, previsões são feitas sobre diversos assuntos que vão desde terremotos até o colapso financeiro de nações (a precisão das previsões feitas pelo Projeto Web Bot é bastante questionável).
O avanço do Big Data esbarra em algumas dificuldades cruciais. Uma delas é o armazenamento das informações que precisam ser processadas. E neste campo, Asimov fez outra previsão, em um livro que dá sequência à série Fundação, escrito 30 anos depois (1983). Durante a busca por informações para a decisão sobre qual deveria ser o futuro da galáxia, Trevize visita um planeta onde dados são armazenados “nos átomos das rochas”. Hoje, na nossa tecnologia, as informações são guardadas em memórias binárias na forma de sequências de “1’s" e “0's" empregando-se transistores, capacitores, discos ópticos ou magnéticos. A relação entre espaço físico e energia necessários para armazenar as informações usando qualquer uma destas técnicas está chegando a um ponto que ameaça a lei de Moore. No entanto, se usarmos a ideia de Asimov, onde um digito binário possa ser armazenado em um átomo, então a capacidade de armazenamento seria virtualmente infinita. Mas armazenar dados em átomos é algo completamente impossível, certo? Bem, nem tanto assim.
Diversos centros de pesquisa estão desenvolvendo os primeiros protótipos de memórias que armazenam informações no spin de elétrons. Spin é uma propriedade quântica dos elétrons que pode ser visualizada como uma rotação do elétron em torno de si mesmo. Em função da rotação, um elétron pode apresentar polaridade magnética num sentido ou no outro, por exemplo, “norte para cima” ou “norte para baixo” e isso pode ser associado ao armazenamento de um dígito binário.


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O spin do elétron define a polaridade de de seus pólos magnético, o que pode ser usado para guardar informações binárias.

Essencialmente, Asimov estava certo de novo! É possível ter um dígito binário armazenado em um átomo! É claro que a tecnologia atual está muito distante de armazenar informações em pedras. Isso hoje só é possível com alguns materiais específicos. Outra barreira é a escala. Os protótipos em desenvolvimento estão longe de alcançar o limite de armazenar um bit em um elétron. Mas essa tecnologia está em um estágio muito embrionário e há muito ainda o que evoluir.
O avanço da tecnologia continua mostrando a sagacidade e genialidade de Isaac Asimov. O que nos resta saber é até onde a mente deste brilhante escritor conseguiu penetrar nos véus do futuro. Quem sabe as histórias de "Despertar dos Deuses" não sejam tão fantasiosas assim e as Viagens Fantásticas ainda possam acontecer? Eu gostaria de estar aqui para ver se ele estará certo.

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