Agência Brasil - Por: Sumaia Villela
A usina deve ser implantada no semiárido pernambucano, mais especificamente no município de Petrolina.
Os espelhos se movimentam de acordo com a posição do sol e refletem os raios para uma torre – chamada de torre solar -, onde o calor é armazenado e transformado em energia.
Um sistema
de energia solar inédito no Brasil, que está sendo estudado como alternativa às
hidrelétricas, pode ser implantado no semiárido pernambucano, no município de
Petrolina, a partir do ano que vem. Com a ajuda de um instituto alemão, a
Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) e a Universidade Federal do
Ceará (UFC) pretendem construir um projeto-piloto na cidade para testar a
tecnologia heliotérmica que, ao contrário dos equipamentos solares já usados no
país, pode armazenar energia para ser usada, inclusive à noite.
A geração de energia heliotérmica
usa o sol como fonte indireta de eletricidade. Ela funciona com um conjunto de
captadores espelhados, distribuídos em uma área plana. Os espelhos se
movimentam de acordo com a posição do sol e refletem os raios para uma torre –
chamada de torre solar -, onde o calor é armazenado e transformado em energia.
Ela é diferente da geração de energia solar fotovoltaica, já explorada no
Brasil, que não é capaz de guardar o calor produzido.
“No caso dos fotovoltaicos, você
teria que ter um sistema de baterias bem caro e complexo para operar. Com o
armazenamento térmico é bem mais viável que a energia fique guardada em forma
de calor para, no momento em que for necessária, ela ser acionada, inclusive à
noite”, explica o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e
coordenador do Laboratório de Energia Solar e Gás Natural da instituição, Paulo
Alexandre Rocha.
A inviabilidade de armazenamento da
energia produzida pelos painéis fotovoltaicos deu a esse sistema a
classificação de forma secundária de energia, usada para complementar a matriz
energética brasileira. “A fotovoltaica tem limite de aleatoriedade. Se não
tiver sol ela para, então sempre tem que ter a hidrelétrica dando suporte como
complementação. No caso da eólica, é muito similar. Se você não tem vento,
precisa acionar turbinas da hidrelétrica para compensar a baixa produção. Já
com o sistema de armazenamento térmico, as turbinas seriam acionadas em caso
extremo”, informa o pesquisador.
As hidrelétricas, capazes de
armazenar energia, são geradoras de 65% da eletricidade do país, de acordo com
o Balanço Energético Nacional 2015, do Ministério de Minas e Energia. A
intenção é mudar esse quadro, argumenta o assessor de Planejamento Estratégico
da Chesf, Benedito Parente. “À medida que os recursos hídricos estão exíguos e
deficitários, e até por uma questão de hidrologia estão com pouca água, se faz
necessário que rapidamente a gente encontre outra alternativa para
armazenamento de blocos de energia”.
Localizada no meio do semiárido
nordestino, Petrolina foi escolhida pela intensidade solar acentuada, de acordo
com Benedito Parente. “A maioria do território brasileiro tem vocação, mas o
semiárido tem ainda mais”, reforça. Para ele, a energia solar heliotérmica é
“uma grande esperança para a produção energética do futuro, uma das mais
atraentes”. O projeto terá tamanho reduzido, compatível com um projeto de
pesquisa, mas a intenção da Chesf, segundo o assessor, é descobrir meios de
produzir a tecnologia em larga escala.
Ar no lugar
de fluidos
Outro ponto considerado inovador
pelo coordenador do Laboratório de Energia Solar da UFC é uma variação no
mecanismo de captação de calor da torre. Enquanto iniciativas de outras regiões
do mundo operam essa etapa com sal fundido, a tecnologia escolhida pelos
cientistas usa o ar. O nome do sistema é “receptor volumétrico aberto”, diz o
professor Paulo Rocha.
“Com isso, a gente não se preocupa
com grandes vazamentos. Em sistemas que usam sal fundido, às vezes você tem
esse problema, porque está trabalhando com grandes variações de temperatura em
tubulações onde passa um fluido líquido pressurizado”, explica o acadêmico.
Esse receptor é usado em uma usina
heliotérmica piloto, construída na Alemanha pelo Instituto solar de Jülich
(SIJ), parceira da Chesf e da UFC no desenvolvimento da torre solar de
Petrolina, que deve ser semelhante ao modelo implantado na cidade alemã. A
empresa alemã Kraftanlagen München GmbH fornecerá a tecnologia necessária.
Para que a ideia seja concretizada,
o grupo tenta conseguir os recursos – cerca de R$ 45 milhões – com a Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), por meio da chamada pública nº19/2015 –
Desenvolvimento de Tecnologia Nacional de Geração Heliotérmica de Energia
Elétrica – do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico do Setor de
Energia Elétrica. Segundo Benedito Parente, o prazo para receber uma resposta
da agência é de até 60 dias.
Em agosto, a proposta passou por
adequações a pedido da Aneel. Caso seja aprovada, começará em 2017 e será
desenvolvida em 40 meses – ou três anos e meio. O estudo deve dar mais detalhes
em relação ao armazenamento da energia: qual a capacidade, por quanto tempo ela
pode ser “guardada”. Os autores da iniciativa também esperam descobrir a
viabilidade econômica da tecnologia, ou seja, qual o custo-benefício do
equipamento.
Sistema
contra perda energética
O projeto de construção da torre
solar não previa inicialmente a etapa de geração da energia, mas a Aneel exigiu
que essa parte fosse incluída na proposta. O professor Paulo Rocha, do
laboratório de Energia Solar da UFC, disse que para aproveitar a oportunidade
de ganho com pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias, o sistema
escolhido foi o Ciclo Rankine Orgânico, que tem o potencial de reduzir perdas
de calor e, consequentemente, de energia. “No Brasil, até onde a gente sabe,
não existe nenhuma planta que utilize”, acrescenta.
O ORC, a sigla em inglês do
equipamento, é uma alternativa ao Ciclo Rankine padrão, que opera com
temperatura mais alta. “O Orgânico se mostra interessante porque opera com
menor calor, então consegue se adaptar em situações corriqueiras de rejeito de
energia, que ocorrem muito na indústria”, compara Rocha. “Todo sistema de
geração de energia elétrica com vapor, principalmente, precisa jogar calor para
fora para funcionar. Isso que a gente chama de rejeito de calor. O ciclo
alternativo vai viabilizar o seu aproveitamento. De alguma forma estamos
conseguindo economizar recursos”, afirma.
Segundo Parente, a previsão é de
que esse bloco de produção gere energia suficiente para alimentar as próprias
instalações da Chesf, com a expectativa de atender inclusive ao local onde
serão desenvolvidas as pesquisas do projeto-piloto. A viabilidade econômica da
aplicação desse sistema também vai ser estudado no decorrer dos 40 meses de
trabalho.
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