Baseado em texto de Graeme Stemp-Morlock
Impressão artística das ondas gravitacionais causadas por dois buracos negros. Se essas ondas puderem ser detectadas, elas poderão esclarecer que a gravidade é mais rápida do que a luz ou não.[Imagem: K. Thorne/T. Carnahan/Caltech/NASA]
Uma questão de escalas
Imagine que você esteja segurando um cubo mágico nas mãos. Ele é quadrado e tem cores diferentes. Se você já tiver lutado com ele por um tempo ele pode estar um pouco mais quente pelo calor das suas mãos ou um pouco escorregadio pelo seu suor.
A física deste cubo é simples: ele tem uma massa bem definida e não pode viajar mais rápido do que a velocidade da luz. E, não importa quanto ou como você o gire, essas leis vão sempre continuar as mesmas.
Mas o que acontece se você der um zoom no cubo, até que possa ver os próprios átomos que o compõem?
De repente, as leis da física mudam completamente. O que vimos em macroescala é muito diferente do que vamos observar agora em microescala, onde as partículas passam a ser governadas pela mecânica quântica.
O maior desafio da física moderna é mesclar esses dois conjuntos de regras, que regem os mundos macro e micro, alinhavando-os em um conjunto único de regras.
Velocidade máxima da luz
Agora, John Donoghue, um físico da Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, acredita que pode ter a resposta.
Talvez, argumenta ele, a visão familiar do espaço-tempo como um tecido de quatro dimensões, que herdamos de Einstein, não seja fundamental, mas só apareça em grandes escalas - exatamente como a nossa imagem sólida e simétrica de um cubo de Rubik desaparece e reaparece dependendo da perspectiva com que olhamos para ele.
Se ele estiver correto, os físicos poderão ter de repensar uma das suas crenças mais queridas: a de que a velocidade da luz sempre foi constante.
Donoghue está ciente de que sua ideia de uma velocidade universal da luz variável vai contra o cerne da física.
"Esta é uma ideia muito fora do padrão", admite ele. "Ela realmente mudaria 99,9 por cento das pequisas na física."
Uma ideia fora do padrão, mas que ganhou as manchetes mundiais há poucos dias, graças a um experimento realizado entre a Suíça e a Itália:
- Neutrinos podem ter viajado mais rápido do que a luz
O telescópio Integral desafiou a física pós-Einstein ao mostrar que a granulação quântica do espaço deve ser muito menor do que se calculava. [Imagem: ESA/SPI Team/ECF]
Precisa-se de uma nova compreensão
No entanto, há boas razões para pensar que nossa compreensão do espaço-tempo e, por conseguinte, da velocidade da luz, precisa ser reescrita.
Os dois pilares da física moderna, a relatividade geral de Einstein, que explica o comportamento de estrelas e planetas em escalas maiores, e a mecânica quântica, que rege as interações das partículas subatômicas, cada uma retrata de forma diferente o papel do espaço e do tempo.
A relatividade geral costura o espaço e o tempo juntos em um tecido de quatro dimensões que pode ser distorcido pela matéria, enquanto as equações da mecânica quântica usam um relógio imutável absoluto para medir os tique-taques regulares conforme o tempo passa.
Esta diferença levou alguns físicos a ponderarem se o caráter do espaço-tempo muda em diferentes escalas.
Espaço-tempo emergente
Os físicos usam o termo "emergência" (característica daquilo que emerge) para descrever como o mundo pode parecer diferente dependendo do zoom que você dê nele, explica Donoghue.
Na vida cotidiana, por exemplo, nos deparamos com ondas sonoras e ondas de água como resultado em grande escala de átomos interagindo uns com os outros em escalas microscópicas; mas as ondas sonoras e as ondas de água não são elas próprias algo fundamental.
No entanto, tem sido difícil formular um modelo em que um espaço-tempo quadridimensional emerge de uma microfísica subjacente que é muito diferente.
O problema é que as teorias alternativas que têm sido propostas para descrever a física em pequenas escalas não se encaixam perfeitamente com a relatividade geral, como deveriam fazer.
Emergente ou não, cientistas já demonstraram que a luz pode ser gerada a partir do vácuo quântico - essencialmente do "nada". [Imagem: iStockphoto/Evgeny Kuklev/Umich]
Luz sem limites
Em particular, essas teorias inadvertidamente libertam a luz, de modo que ela já não obedece mais a um limite de velocidade em grandes escalas - desafiando as observações históricas, que confirmam as previsões feitas pela teoria da relatividade geral.
Entretanto, Donoghue e seu colega Mohamed Anbar, da Universidade de Toronto, no Canadá, demonstraram recentemente que a velocidade da luz, em si, pode variar em altas energias - como as observadas no início do universo - com uma velocidade máxima, única e constante da luz emergindo só mais tarde, conforme a energia do universo se reduzia.
Neste modelo, as partículas elementares e os campos de diferentes naturezas, cada um deles poderia "ver" um universo com uma velocidade da luz diferente, o que significa que as leis que governam o comportamento de cada tipo de partícula e campo seriam ligeiramente diferentes.
Conforme as partículas e os campos interagem uns com os outros, a limitações à velocidade da luz começariam a surgir, fazendo com que ela eventualmente alcance a velocidade constante que vemos hoje.
Velocidade da luz emergente
Jan Ambjorn, um físico do Instituto Niels Bohr, em Copenhague, na Dinamarca, é um fã do trabalho de Donoghue.
Perguntar se a velocidade da luz é emergente é "uma questão totalmente legal", diz ele.
Nós ainda temos dificuldades para entender o que aconteceu no início do universo, então "pode ser que alguma nova perspectiva seja necessária", acrescenta.
Eleanor Knox, especialista em teorias emergentes do espaço-tempo, no King's College London, concorda que as ideias de Donoghue são "um bom caminho à frente."
Entretanto, ela observa que, até que ele e seus colegas tenham uma teoria mais específica, será difícil saber onde procurar por evidências de uma velocidade da luz emergente.
O Telescópio Einstein vai procurar ondas gravitacionais, minúsculas variações na estrutura do espaço-tempo, previstas por Albert Einstein em 1916. [Imagem: ASPERA]
Energias altas demais
E é justamente isso que Donoghue e Anbar pretendem fazer, com um financiamento do Instituto FQXi, uma entidade sem fins lucrativos cuja proposta é discutir as questões fundamentais da física e do Universo.
Eles esperam resolver o problema da emergência da velocidade da luz refinando a sua teoria, para que ela possa fazer previsões específicas sobre onde procurar sinais experimentais de um limite de velocidade emergente.
Infelizmente, a maioria dos efeitos de diferentes velocidades da luz só seria perceptível a energias extremamente altas, muito maiores até mesmo do que as alcançadas no famoso Grande Colisor de Hádrons.
Velocidade de gravidade
Mas entra então em cena uma das implicações mais estranhas e pouco comentadas da nova teoria.
Segundo o modelo de Donoghue, pode haver uma chance de que a velocidade da gravidade seja maior do que a velocidade da luz.
Geralmente, os físicos imaginam que as duas velocidades sejam idênticas, já que ninguém realmente entende exatamente o que seja a gravidade: ninguém nunca detectou um "graviton", uma partícula que contenha força gravitacional.
E comprovar uma relação entre a velocidade da luz e a velocidade da gravidade tem sido uma tarefa desafiadora também porque tem sido difícil localizar as hipotéticas ondas gravitacionais - ondulações no tecido do espaço-tempo -, embora haja motivos para acreditar que se esteja chegando lá.
Quando, e se, os sinais das ondas gravitacionais forem finalmente detectados, então poderá ser elucidado esse descompasso de velocidade.
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